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Coordenação

Manuel Deniz Silva (Investigador Responsável)
Mário Vieira de Carvalho (Co-investigador Responsável)

Financiamento
 
Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)
 
Referência

2022.05129.PTDC
 
Prazo de Execução

01/02/2023 - 31/01/2026
 
Instituições envolvidas (em colaboração ou parceria)

INET-md, FCSH-UNL
 
 
Resumo
 
Em 1967, durante a sua estadia em Paris, Luís Cília gravou a canção "É preciso avisar toda a gente", um poema de João Apolinário, jornalista exilado no Brasil. Como muitos outros artistas, ambos haviam fugido de Portugal, escapando à censura e à perseguição política do regime ditatorial do Estado Novo. Poema e música transmitiam o mesmo sentimento de urgência, a mesma necessidade de "sussurrar a palavra" sobre a tristeza, a morte e a dor causada pelo regime autoritário. Sete anos depois, na véspera do 25 de abril de 1974, duas outras canções transmitidas pela rádio deram o sinal para o início das operações militares que restauraram a democracia e desencadearam a Revolução dos Cravos. Durante os 41 anos de Estado Novo, a música teve um papel essencial na construção da resistência cultural e na expressão da contestação política. Circulou amplamente entre grupos de oposição legais e ilegais, através de discos introduzidos clandestinamente no país ou de transmissões de rádio a partir de Argel ou Bucareste. Canções de protesto foram cantadas em reuniões clandestinas, greves e manifestações não autorizadas, comícios estudantis e dentro das prisões políticas do regime. Muitos dos autores destas canções encontravam-se exilados em França, destino de um intenso fluxo de migração política e económica (entre a década de 1950 e o fim do Estado Novo, cerca de um milhão de portugueses emigraram para França [Pereira 2012]). Este repertório musical permanece fortemente ancorado na memória coletiva portuguesa e é regularmente cantado em comemorações oficiais e não oficiais da Revolução dos Cravos. No entanto, uma investigação aprofundada sobre a produção musical no contexto do exílio em França durante a ditadura encontra-se ainda por fazer.
 
O principal objetivo de MUSEX é explorar o impacto da experiência do exílio na criação musical. O projeto está organizado em três linhas de pesquisa que abrangem o vasto período cronológico da ditadura: uma história etnográfica de percursos individuais; uma história cultural, social e política das práticas musicais; e uma análise da criação e produção musical. A equipa de investigação combina especialistas de diferentes domínios (musicologia, etnomusicologia, história política, social e cultural, estudos de teatro e cinema) e realizará um extenso levantamento de arquivos documentais em Portugal e em França, e de recolha de testemunhos orais de músicos e outros agentes envolvidos na produção musical no exílio. Vários estudos de caso serão analisados, tendo em conta diferentes géneros e práticas musicais, desde o compositor comunista Fernando Lopes-Graça, exilado em Paris na década de 1930, até aos cantores de música popular ativos em França durante as décadas de 1960 e 70, associados sobretudo à esquerda radical (José Mário Branco, Sérgio Godinho, Tino Flores, entre muitos outros). Apesar das diferenças geracionais e de abordagem musical, Lopes-Graça foi uma figura particularmente influente para estes músicos enquanto símbolo de resistência política e pelo seu trabalho pioneiro sobre a música tradicional portuguesa. MUSEX estudará a relação destes músicos com a complexa rede de organizações políticas e culturais no contexto do exílio, contribuindo para a historiografia da resistência portuguesa e destacando a importância de analisar a circulação de produções culturais e artísticas. Ao aplicar a metodologia de histórias de vida, o projeto abordará os complexos processos pessoais e criativos inerentes à experiência de exílio, nomeadamente as diferentes formas pelas quais os músicos portugueses exilados transplantaram, aculturaram e reterritorializaram as suas práticas artísticas e políticas. Outra prioridade deste projeto é a promoção de uma perspetiva global sobre o exílio, que atravessará necessariamente as tradicionais fronteiras entre história nacional e internacional. Vários membros da equipa de investigação estão sediados em França e a colaboração com os consultores do projeto proporcionará parcerias científicas com outros grupos de pesquisa dedicados ao tema da música e do ativismo político no Reino Unido e nos EUA. Alinhado com a Agenda 2030 da ONU, MUSEX tem igualmente como objetivo consciencializar para desafios contemporâneos e mobilizar energias e conhecimentos para além do âmbito académico. A equipa de investigação desenvolverá uma estreita parceria com organizações dedicadas à discussão e preservação da memória da resistência à ditadura, tais como a Associação Lopes-Graça, a Associação José Afonso, o Observatório da Canção de Protesto e a Associação Memória Viva (Paris), entre outras. Serão organizados regularmente na FCSH seminários interdisciplinares e colóquios, abertos a estudantes. Os principais resultados deste projeto serão a publicação de um volume coletivo de ensaios, artigos em revistas científicas e capítulos de livro, uma conferência internacional, um site, dois CDs áudio, um documentário e uma exposição documental.
 
Palavras-chave

Música e Resistência; Memória do Exílio Português; Herança Cultural; História Global.