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VI Jornadas Científicas INET- md, FMH e ESD
 
29 de junho 2024 | Edifício Principal da Faculdade de Motricidade Humana, Cruz Quebrada
 
Formulário de inscrição aqui.
 
Práticas somáticas na contemporaneidade: Corpo, consciência e resistência
 
Inspirados pelos novos paradigmas do corpo que se desenhavam desde o início do século XX, e pela crescente popularidade de filosofias e práticas orientais no Ocidente, os pioneiros da educação somática desenvolveram um conjunto de práticas que visavam incentivar a propriocepção musculo-esquelética e, por essa via, as conexões corpo-mente. Instigado pela sua verdade anatómica, perspectivava-se este "corpo natural" como caminho para um autoconhecimento relacional e criativo, e a expressão da autenticidade do self, processos dos quais derivaria, num sentido holístico, a sua eficácia funcional.
 
Sobretudo radicado no tecido cultural euroamericano, o trajecto da educação somática objectivou-se em abordagens alternativas para a recuperação ou prevenção do desajustamento psicofísico, e tornou-se particularmente relevante no campo da dança: subverteu as hegemonias estéticas e éticas das danças clássica e moderna e dos correspondentes regimes de treino. Foi tendo, ainda, influência acrescida nos territórios das psicoterapias corporais e expressivas.
 
Na dança contemporânea o impacto das práticas somáticas tem-se observado na assunção da organicidade do corpo do intérprete como parte do seu desempenho, na criação de novos vocabulários do movimento que expõem a personalidade motora e revelam a individualidade, reforçando a assinatura autoral de uma dança.
 
Expandir a consciência corporal interna é mergulhar na experiência de um corpo permeável e pulsante o que requer, simultaneamente, o exercício de assimilação de um tempo mais pausado e dilatado. Numa época digital, onde predominam as tiranias da velocidade que Paul Virilio (2007) denuncia, assumir a prática somática enquanto visão epistemológica é, em si, um ato de resistência. A psicanalista Suely Rolnik (2020) corrobora o argumento acrescentando que, na nossa relação com uma realidade contemporânea cada vez mais confusa, é no corpo que reverbera a encruzilhada dos mecanismos biológicos e da cultura, e a reactividade do sujeito às circunstâncias envolventes. É, por isso, em sintonia com a escuta interna do corpo que o sujeito pode configurar "micropolíticas de resistência".
 
Considerando que todo o movimento do corpo é uma produção cultural que dissemina valores estéticos e políticos, Doran George e Susan Leigh Foster (2020) trazem outro ponto de vista ao debate: questionam se a dimensão universalizante implícita à ideia de uma eficácia funcional imbricada na profundeza musculo-esquelética desse "corpo natural" se pode subtrair a condicionalismos de ordem cultural e social. No caso da dança, interrogam-se, estarão as Somáticas a introduzir um novo standard de virtuosismo que tanto pode libertar processos de expressão da identidade como induzir outros tipos de exclusão? Em que medida a globalização e os crescentes consensos em torno das Somáticas são (involuntários) cavalos de Troia para a expansão do ideário (neo) liberal que, desde o pós-guerra, sobrevaloriza o binómio liberdade/individualidade como alicerce do capitalismo contemporâneo?
 
A noção de que a consciência de si se intensifica através da percepção somática é, provavelmente, a maior contribuição que as Somáticas trouxeram para a dança e outras abordagens da corporeidade no contexto cultural ocidental. Ademais, o tempo pandémico ampliou entendimentos colectivos acerca do impacto da privação sensorial e relacional, e do papel da conexão mente-corpo, na autorregulação individual e social. Estas asserções têm vindo a encontrar, ainda, fundamentação no campo neurocientífico.
 
Por ocasião do lançamento do número da Revista RED sobre A educação somática e a consciência corporal num mundo digital, é objectivo destas Jornadas, dedicadas às "Práticas somáticas na contemporaneidade: Corpo, consciência e resistência", promover um diálogo crítico e aberto sobre as práticas somáticas, contextualizado na sua conjuntura política, cultural e teórica, e inscrito na paisagem mental, educativa e artística do nosso tempo:
 
  • Qual a relevância da consciência somática em contextos futuros? 
  • De que maneira pode contribuir para (re)pensar a educação? 
  • Como se relacionam as Somáticas com processos e práticas artísticas? 
  • Que papel podem desempenhar na conciliação da dimensão experiencial do corpo num mundo cada vez mais acelerado, mediado por conexões virtuais e dominado pela imagem normalizada? 
  • Considerando o seu papel na autorregulação individual e social, como fundamentar o recurso a práticas somáticas em ambientes psicoterapêuticos ou inclusivos?
  • Como pode a educação somática ser coadjuvada pelo saber neurocientífico?
  • Em que termos inscrever as Somáticas no debate crítico dos Estudos Culturais para gerar perguntas produtivas para ambos os campos?
 
 
Comissão Científica: Coordenação: Cecília de Lima (INET-md ESD) e Rita Rato (INET-MD, FMH), com Elisabete Monteiro (INET-MD, FMH), Luísa Roubaud (INET-MD, FMH) e Sergio Bordalo e Sá (INET-MD, FMH).
 
Apoio à divulgação e organização: Lidia Labianca e Michele Leitão
 
 
 
Entrada livre, mediante inscrição prévia através de formulário online.
 
 
 
KEYNOTE SPEAKER – CIANE FERNANDES
 
 
Somática em Campo Expandido: Prática como Pesquisa e Contracolonialidade no Hidroceno
 
A Somática na contemporaneidade vem se desdobrando e ampliando seus fundamentos e abordagens, não apenas criando novas vertentes mas também integrando tendências e tradições diversas, em diálogo com as artes em campo expandido, as culturas originárias, grupos subalternizados diversos e igualdade social. A partir de técnicas e estratégias afetivas de respeito às singularidades e à diferença, o empoderamento da corporeidade como fonte de criação de conhecimento no campo acadêmico é um processo contracolonial que liquidifica dualidades, adestramentos, subalternidades e extrativismos, reterritorializando memórias hídricas conectivas constitutivas da própria vida (4a fase da água).
 
Ciane Fernandes | É professora titular da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia e uma das fundadoras do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas desta universidade; professora também do Programa de Pós-Graduação em Dança da UFBA; mestre e Ph.D. em Artes & Humanidades para Intérpretes das Artes Cênicas pela New York University (1992 e 1995); pós-doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela UFBA (2010) e Analista de Movimento pelo Laban/Bartenieff Institute of Movement Studies (1994), de onde é pesquisadora associada. Autora de várias publicações, palestras performativas e imersões no Brasil e no exterior, inclusive com membros do Coletivo A-FETO de Dança-Teatro, o qual fundou e dirige desde 1997. Desde 2008, tem enfocado a Somática e o Sistema de Movimento Laban/Bartenieff aplicados à Prática Artística como Pesquisa, no contexto da performance em campo expandido, em especial da ecoperformance em ambientes aquáticos, em diálogo com a diversidade e a deficiência. Neste campo temático, desenvolveu a Abordagem Somático-Performativa e a Imersão como Pesquisa.
 
 
 
WORKSHOP 1 - com SOFIA NEUPARTH 
 
Práticas de Criar Corpo
 
A dança nasce cada dia, nasce como uma forma de ir-sendo que se dá ao aparecer mais ou menos visivelmente a cada momento. Acompanhar esse nascer é delicioso! Apurar o sentir é uma prática diária. Um sentir que se apura na atenção viajante saboreando o encontro com o acontecer.
 
Permitir-nos estar com as subtilezas, os silêncios, o entre-corpos, os ritmos, as gargalhadas, o nascer da voz mais muda ou mais falante, escutando o contínuo chegar da pele da terra à pele da planta do pé...
 
Muitas das práticas que dançamos vão-se desenhando a partir da experiência da dança lado-a-lado com o estudo da viagem embrionária. Movimentos como expandir-enrugar, gerar espaço, irradiar desde um centro móvel ao que vão sendo as bordas e voltar a centrar, embalar longitudinal ou lateralmente, enraizar-levitar, empurrar-puxar... fazem-se gesto e geram dança.
 
 
Sofia Neuparth | Tem um percurso singular no seio da Arte Contemporânea em Portugal. Nos anos 80 deu forma ao organismo de investigação artística nos estudos do Corpo, do Movimento e do Comum: o c.e.m-centro em movimento. É o entendimento que tem do Corpo que determina todo a sua acção na experimentação, formação, programação, documentação, criação e intervenção política. Na escrita em estado de Dança destaca em 2010 "práticas para ver o invisível e guardar segredo", "movimento" (2014) ou "Criação" (2020 com M. Agostinho). Na criação em Dança destaca "mmm-um poema físico" (2005), "Sopro" (2017) ou "Mulheres de papel" (2024).
 
 
WORKSHOP 2 - com PASCOAL AMARAL
 
Práticas de mente-corpo orientais: introdução a uma abordagem holística e milenar
 
Com o progresso das civilizações e a transformação da visão das populações contemporâneas sobre o propósito de vida, as práticas de mente-corpo têm conquistado um lugar importante nos modelos promotores de estilos de vida saudáveis. No Ocidente, as práticas psicocorporais Orientais têm sido acolhidas por profissionais de diferentes áreas, sobretudo devido ao impacto positivo que estas práticas geram em diferentes dimensões da saúde. Contudo, mais do que meros exercícios físicos e mentais, as práticas de mente-corpo Orientais têm por base princípios filosóficos que convidam os praticantes a pesquisar um sentido para a existência humana através da experiência e da unificação do binómio mente-corpo. Com este workshop, pretende-se dar oportunidade aos participantes para sentirem alguns dos benefícios do Taichi e Qigong – práticas de mente-corpo orientais que são orientadas pelos princípios holísticos e de mindfulness –, e nutrir a consciência dos profissionais de educação para a importância da disponibilização universal destas práticas.
 
Pascoal Amaral | Doutorando em Educação (especialidade em Educação para a Saúde) na FMH-UL e Mestre em Saúde Pública e Desenvolvimento pelo IHMT-UNL. Desde 2021 leciona as unidades curriculares de Anatomofisiologia, Cinesiologia e Neuropsicologia do Movimento na ESD-IPL, instituição onde se licenciou em Dança em 2017. No âmbito das práticas de mente-corpo, começou a estudar yôga e meditação aos 14 anos, tendo-se dedicado ao aprofundamento do estudo de Taichi e de Qigong durante a especialização em Medicina Tradicional Chinesa. Desde 2016, forma terapeutas de Qigong terapêutico na ESMTC. Em 2022 e 2023, integrou o projeto Hand in Hand (projeto europeu de políticas públicas) e deu formação a docentes portugueses tendo em vista a integração das práticas de mente-corpo no ensino português, entre outros objetivos. Atualmente, integra ainda a Escola Superior de Saúde Jean Piaget em Almada, e acumula um percurso vasto de prática clínica e de chefia de equipas clínicas.
 
 
 
 
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